(Leia este texto ao som de Tenerife Sea)
Uma quantidade absurda de coisas para resolver ficaram pendentes depois de eu ficar uma semana longe da cidade. Um pouco para fazer hoje, outro tanto distribuído ao longo dos dias. Pisco duas vezes e fico olhando o mundo como se tudo na frente dos meus olhos estivesse sob o meu controle. Finjo que está.
Todos as manhãs depois de acordar, eu faço uma agenda mental de cada uma das coisas que eu preciso fazer ao longo do dia. Passar nas outras salas do escritório para desejar bom dia às pessoas, responder os e-mails que ficaram pendentes no dia anterior, molhar as plantas na sacada da sala de reuniões, lavar a xícara de café que ficou suja porque não deu tempo de limpar no dia anterior e escrever para saber de você.
Eu sempre deixei uma soberba chata incomodar aqui dentro dizendo que se eu não fosse por mim, o meu universo não se moveria. Um pouco de esforço aqui, um monte de coisas empilhadas umas depois das outras para fazer até o fim do dia. E nada diferente ao término de tudo.
Ficar longe da rotina por um tempo me fez perceber que talvez esteja tudo bem não darmos conta de tudo o tempo inteiro. A vida segue do mesmo modo quando não somos capazes de abraçar o mundo.
Não foi uma nem duas vezes que eu permiti que o mundo criado pelo meu próprio subconsciente me devorasse. Um amontoado a mais de coisas para fazer, um pouco menos de tempo para dar carinho para quem eu amo. Um erro empilhado atrás do outro, um pouco mais de obrigações para agora e a vida, bom, ela poderia ficar para depois.
Mas as coisas não podem ser assim o tempo inteiro.
O que a gente esquece às vezes é que não somos obrigados a salvar o mundo todos os dias. O peso de querer fazer tudo com perfeição o tempo inteiro não faz bem para nossa saúde mental.
Eu só percebi isso depois de me dar conta que eu não estava conseguindo dar atenção a quem amava do modo que precisava, e isso me levou a uma sequência quase interminável de erros. Eu com a minha rotina aqui, ela com a dela do lado de lá. Mas entre uma aula e outra talvez ela precise saber que eu estou aqui para o que precisar.
Pisco duas vezes e fico olhando o mundo como se tudo na frente dos meus olhos estivesse sob o meu controle. Finjo que está enquanto lembro de mandar uma mensagem para quem amo para lembrar que ainda me preocupo e estou aqui. Afinal de contas, as coisas se tornam menos pesadas quando a gente percebe que não é preciso dar conta de tudo.
Júlio Hermann
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*Meu primeiro livro já está à venda em todo o Brasil. Se você gostou desse texto, tem grandes chances de se identificar com ele.
Tudo que acontece aqui dentro – cartas de amor nunca rasgadas
“Você lê aquilo que sempre quis dizer a alguém – ou a si mesmo -, mas que nunca teve coragem de tirar de dentro de si.” – Daniel Bovolento, autor de Por onde andam as pessoas interessantes? e Depois do fim.
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