As algemas que me prendiam

(Leia este texto ao som de Two Hearts)

Te enxergar caminhando foi uma das cenas mais bonitas que eu já vi. Foi enquanto a chuva caia na esquina da minha casa e eu esperava o mau tempo passar, projetando em você momentos que talvez nunca fossem nossos. Você respirava fundo naqueles dias, eu quase surtava por estar virando trapo pelo excesso de trabalho e preocupações. Até que você sorriu.

Eu passei em três farmácias diferentes no caminho de casa, tentando comprar doses de remédios dosados sem receita. O que eu precisava mesmo era de uma noite de sono bem dormida, com o celular no modo avião e o wi-fi desligado. Mas como eu iria saber disso? Eu sabia dos meus compromissos, do mundo ao meu redor, do quanto você deixava a coisa toda mais leve quando dizia qualquer coisa para mim.

Foram dias um pouco doidos para mim, entende? Eu tentei separar as coisas, deixar o peso do mundo do lado de fora do meu apartamento, mas era impossível arrancar de mim órgãos vitais para fingir que nada estava acontecendo. Não dormi algumas noites naquelas semanas, imaginando o que seria da vida e o que seria de mim se tudo continuasse como estava.

Você gritava liberdade.

Existem trabalhos, sonhos, estudos, compromissos que são como cadeias em nossas vidas. Não dão asas, não retiram a gente do chão. Sugam pedaços nossos que um dia estiveram seguros, porque tomam nossas mentes e corações com pesos excessivos. Lutamos para resolver, empenhamos forças que nem sabíamos existir em nós, na esperança de dar certo.

O amor me serviu como um sopro suave naqueles dias, trazendo um sorriso de coragem para acordar nas segundas pela manhã. Você me puxava de volta, como quem arrasta um corpo estático para algum lugar diferente do que estava. Eu, perdido, tentava colocar o melhor de mim para dar jeito de libertar os meus pulsos daquelas algemas.

Não existia nada de charmoso no que me dizia, mas você tinha razão quando gritava que eu merecia ser feliz. Você nunca soube, mas isso foi suficiente para que eu entendesse que nenhuma treva foi capaz de durar o mundo. Um dia elas acabam, se dissipam, mudam de direção.

Eu precisava mudar de vida, deixar algumas coisas para trás. Te enxergar caminhando era bonito porque me mostrava que a vida permanecia em curso, apesar de mim.

O amor se move às vezes, muda de lugar, habita espaços diferentes.

Eis a libertação. Um dia a vida chegaria com a chave para me libertar das correntes. De agora em diante, que eu só me prenda ao amor.

Júlio Hermann


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Um comentário sobre “As algemas que me prendiam

  1. Tatianices disse:

    “Existem trabalhos, sonhos, estudos, compromissos que são como cadeias em nossas vidas. Não dão asas, não retiram a gente do chão. Sugam pedaços nossos que um dia estiveram seguros, porque tomam nossas mentes e corações com pesos excessivos. Lutamos para resolver, empenhamos forças que nem sabíamos existir em nós, na esperança de dar certo.”. Tocante, na medida certa. Obrigada por mais esse texto!

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