Se você não risse

(Leia este texto ao som de Eu vou)

Se não fosse pelo teu modo de deixar escapar uma risada enquanto sorri, provavelmente minha mente não teria dado nó dessa forma. Eu teria comentado com um ou dois amigos enquanto caminhava pela Vila Madalena, esperando o Uber chegar. Depois não haveria mais nada para se contar ali.

Mas você ri.

Eu teria planejado uns dias a mais na praia ao invés de escolher olhar para o concreto durante uma segunda-feira à noite em pleno dezembro. Não haveria problema se eu resolvesse pisar firme no acelerador logo depois de o sol despencar em uma tarde de verão – só pela sensação de liberdade que o vento batendo no rosto me causa -, mas não seria tão prazeroso quanto ter a mínima chance de esbarrar contigo em uma cidade em que há outras doze milhões de pessoas.

Seria impossível, eu sei, mas isso não torna minha ansiedade menos bonita.

Provavelmente eu beberia só mais duas cervejas até minha mente acusar perda de sentidos, mas embriaguez nenhuma seria capaz de causar em mim o mesmo efeito que o som da tua voz. Não assim, de súbito, enquanto eu ainda decido se volto para casa ou espero mais algumas horas na esperança te ver.

Sendo sincero, acho que eu procuraria por quatro mil maneiras diferentes de me colocar em órbita de novo, mas efeito outro nenhum brotaria da minha pele se não fosse pelo sol que esbarra com o meu rosto. O calor me causa um desconforto diferente.

E você sorri, outra vez, mesmo que longe de mim.

Então eu te espero.

Digo para as pessoas que São Paulo é quente quase todos os dias porque sinto parte de mim se espalhar por aí da mesma forma com que o vapor sobe do asfalto nos dias de sol em que resolve chover.

Vai ver meu peito precise evaporar vida de alguma forma também.

Vai ver você sinta o efeito desse meu ato tocando tua pele.

E você nunca percebeu o som que sai do teu sorriso quando diz qualquer coisa boba por aí.

Conto de ti ao meus amigos como se nada fizesse sentido, tento desviar o assunto enquanto eu ainda consigo me localizar em mim, busco dizer à minha própria mente que o meu peito permanece intacto depois de tudo… Talvez eu precise me deixar extravasar de alguma forma.

Nas tardes e noites em que não sei exatamente o que escrever, eu penso e repenso a vida como se o mundo à minha volta se limitasse ao modo com que você não deixa a felicidade presa dentro de si.

E gargalha ela em mim.
Até eu me desconstruir. Em dois.
Mas esse desconforto é bom.

Júlio Hermann

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