(Leia este texto ao som de Perfect)
Eu já não sou capaz de perceber as coisas além do ponto onde a minha visão alcança. Faz vinte e quatro horas, pelo menos. Uma semana atrás eu percebi que as coisas começavam a sair do meu foco. Comecei a me apoiar nos móveis enquanto caminhava, por puro medo de cair. Mas o apoio não passava de simbólico.
Eu não sei o que aconteceu e eu juro que não fiz nada de errado, mesmo. Eu eu já errei um milhão de vezes ao longo do caminho que nos trouxe até aqui, mas não dessa vez. Pequei pela ausência de carinho, errei ao me preocupar demais com as coisas que pareciam estar sobre o meu controle e não falavam da gente. E me esqueci do importante.
Você não tem nenhum motivo para acreditar em mim, eu sei. Mas uma consciência tranquila do lado de cá não da conta de diminuir a falta que você me faz. Acordei quatro vezes durante essa madrugada, tentando me localizar no escuro mais uma vez. Mas nem a luz vinda do televisor foi o suficiente para me ajudar.
A falta que eu sinto tem a tua risada e o tom da tua voz que eu já não escuto antes de dormir. É estranho pensar nisso porque eu ainda ouço os nossos áudios antigos antes de colocar a cabeça em definitivo no travesseiro. Visito os momentos que eram só nossos, tento arrancar cada uma das sensações do passado para faze-las presente, mas não adianta muito.
Apoio as duas mãos sobre a mesa do escritório. Coloco as duas pernas cruzadas esticadas para frente da cadeira de rodinhas, como sempre fiz. Baixo os olhos o suficiente para ver minhas duas mãos unidas logo acima da camiseta. Tudo em uma tentativa fracassada de fazer o tempo voltar para os dias em que a felicidade bastava.
Não percebo muita coisa, não enxergo tanto quanto costumava enxergar do mundo um tempo atrás. Parece mesmo é que a saudade tomou conta do foco e eu não sou capaz de ver muito além disso. Sinto tua falta, procuro por uma maneira de te dizer que eu não fiz nada dessa vez, mesmo, e que tudo o que eu preciso é escutar a tua voz para não acordar assustado logo depois de deitar para dormir.
Júlio Hermann
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Tudo que acontece aqui dentro – cartas de amor nunca rasgadas
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