(Leia este texto ao som de Youth)

O bicho que berra aqui dentro não é o mesmo que o teu, eu sei. Mas de vez em quando bate uma sensação de que você sente o mesmo e fica aí, se escondendo pelos cantos. Me disseram uma vez que era medo, mas medo não deixa a gente aos trapos.

Pensei nisso enquanto voltava pra casa. Três e vinte e oito da manhã. Hora boa para estar dormindo, dizia para mim. Hora boa para estar fazendo qualquer coisa que não resolvendo problemas.

Na mesma tarde a gente tinha conversado sobre isso, não tinha? Você com consulta marcada, eu com umas marcas chatas fazendo coceira no canto do braço. Você comentou sobre os problemas que enfrentava para resolver as coisas na faculdade, eu falava dos prazos que me devoram aos poucos enquanto o relógio se movimenta.

Fiquei lendo um livro quando você saiu. A gente tenta trinta vezes adivinhar o que o outro pensa e o que o outro sente, mas nunca dá certo, já percebeu? Percebe que as coisas tão assim por culpa nossa também. O mundo só bate na cara de quem oferece o rosto para apanhar.

É aquela história chata de brigar contra si mesmo o tempo inteiro. Se eu não der um jeito de colocar as coisas aqui dentro no seu devido lugar, mesmo que a gritos, quem vai por mim? É bonito pensar que hora ou outra chega alguém que vira o mundo a nossa frente do avesso. O problema é o medo que se forma antes mesmo de acontecer.

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Nem tudo vai ficar assim para sempre, me disseram. Eu mesmo quando cheguei em casa percebi o mundo mutando desse jeito quase utópico que a gente sofre para enxergar olhado de dentro. Mas é isso mesmo.

O berro fura os tímpanos às vezes, mas tá tudo bem. De vez em quando é só com a gente, noutras oportunidades envolve quem nunca imaginamos. No fim é sempre a mesma coisa. Recolher os trapos e rezar para tudo ficar bem na manhã seguinte.

Júlio Hermann